ESGLiderançaNova Economia

Quais as perspectivas de futuro para o ESG?

By 15 de Janeiro, 2023Outubro 27th, 2023No Comments

2023 começou agitado para o Brasil. Troca de governo, fortes tensões sociais e uma crise envolvendo uma grande empresa brasileira. Crises, tensões e mudanças criam espaços para colocarmos alguns temas em perspectiva e o que eu quero abordar aqui é um pouco da agenda de futuro do acrônimo ESG ou ASG em português, que significa Meio Ambiente, Social e Governança. 

Se esse tema ainda é novo para você, te sugiro a leitura desse meu artigo que explica o que é o ESG e porque ele é importante, clicando aqui.

A crise da grande corporação brasileira me relembrou uma história de uns anos atrás que me impactou tanto que ficou no meu imaginário. Quando a crise da Vale do Rio Doce emergiu, o CEO da empresa que eu trabalhava na época comentou: “eu fico pensando nas pessoas que trabalham naquela organização, como elas recebem essa notícia, como elas se sentem. É terrível para a vida dessas pessoas.” 

Ano passado eu fiz um verdadeiro MBA em crise e gestão de crise na prática. Não desejo a ninguém enfrentar uma crise na organização que trabalha ou, como foi meu caso, entrar em uma organização em meio a uma crise. Mais adiante irei contar o porque a crise foi um MBA. Mas agora quero voltar às notícias do início deste ano. 

As Lojas Americanas encontraram inconsistências em seu balanço da ordem de bilhões. Mais uma vez eu só consigo pensar nas pessoas. Como o operador de caixa de uma de suas unidades se sentiu nesse dia. Como é para cada um dos milhares de colaboradores chegar em casa, que sensações eles têm no corpo e como foi encarar o dia seguinte. Nas manchetes vi uma notícia que os principais acionistas perderam milhões. Mas como é o impacto na prática para quem têm muito menos e vive com um salário?

As empresas – ou seja – os trabalhos das pessoas também são os chãos delas. Ainda que sejam chãos provisórios, mas quando ele se abala, as pessoas vivem um verdadeiro terremoto. 

 

Mas a pergunta é: o que isso tem a ver com ESG? Simplesmente TUDO. 

 

Primeiro vamos começar do G de governança. Governança tem a ver com transparência, com os reportes financeiros, com a transparência para com os acionistas. Sim, as ações das Lojas Americanas eram – e provavelmente deixarão de ser – listadas em bolsa. Listar na bolsa é como ter outras pessoas de fora para você prestar contas. É como se você tivesse investido em um terreno de tantos hectares e quando você foi lá a medição estava imprecisa e… você rasgou dinheiro. 

Os capítulos que se seguem dessa ou de qualquer outra empresa que passa por isso trazem perspectivas não tão positivas. A marca deixa de ter valor, entra com pedido de recuperação judicial e milhares de pessoas correm o risco de perderem seus empregos. Isso traz consigo um impacto no poder de compra dessas pessoas, nas economias locais. E aí, o G de governança intersecciona com o S do ESG, que é o social – que tem a ver com todas as pessoas que uma empresa se relaciona: colaboradores, fornecedores, clientes, acionistas e comunidade. 

Bom, com esse cenário todo, com direito a caso prático, já dá o contorno para o que esperar para 2023 na agenda de ESG. 

O primeiro ponto é claro e transparente: as empresas que não colocarem o ESG no centro da estratégia vão ficar para trás. 

 

Simples assim: ESG não é tema de uma área ou silo dentro da empresa. É uma maneira de fazer negócios. Ou uma empresa é responsável ou não é. Não existe meio termo ou atalhos. Cada vez mais essa pressão vai aumentar. Afinal, quem puxa e determina a pauta ESG é a sociedade civil – as pessoas – ou o governo, que cada vez mais tem informação disponível sobre a escassez dos recursos e o impacto positivo e negativo que as organizações têm. 

O Governo atua por meio de regulações, de tributação e com isso vai trazendo novos contornos para o tema que faz com que as empresas busquem se adequar. As pessoas são o grande direcionador dessa mudança por conta do seu poder individual de escolha e de compra. Nomear as suas escolhas, preferindo marcas em detrimento de outros e com isso determinando o que realmente importa para elas por meio de sua ação. 

Nesse aspecto trago três dados chave que demonstram o quanto a agenda ESG é prioritária para a sociedade e verdadeira tendência para quem quer sobreviver no mundo dos negócios:

 

99% dos investidores utilizam as divulgações ESG das empresas como parte de suas decisões de investimento. 

Fonte: Global Reporting and Institutional Investor Survey – Ernest Young

 

 81% das empresas afirmam destinar recursos específicos para ações de diversidade e inclusão (o S do ESG) em 2023. Em 2020 o número era de 67%.

Fonte: pesquisa da Blend.Edu

 

Apesar da pressão da inflação dos preços,  70% dos clientes dizem que estão dispostos a pagar um prêmio por produtos com impacto ambiental positivo ou benefícios à saúde.

Fonte: Bain Company

Enquanto algumas empresas ainda estão amadurecendo o tema, outras já compreenderam que tanto o investidor quanto os consumidores se importam com o tema e estão desenhando estratégias e práticas para atingirem os objetivos. 

Na minha experiência, são três os ingredientes para as organizações terem sucesso nessa missão: patrocínio da alta liderança, fazer parte da estratégia do negócio e ter de fato orçamento dedicado

 

O segundo ponto é que ESG é sobre liderança. 

 

E liderança é sobre coragem. 

O mundo mudou muito rápido e a previsão é que a quarta revolução digital – com inteligência artificial, big data e outras siglas – intensifique ainda mais o ritmo das mudanças. Mas, existem coisas que não mudam: integridade, ética e valores. Ingredientes estes que tem a ver com liderança. 

Com as redes sociais e a velocidade da transmissão das informações, cada vez vai sobrar menos espaço para uma liderança que não encara a pauta dura do ESG e faz a transformação necessária acontecer. 

Aqui eu compartilho uma experiência pessoal, sobre o MBA em gestão de crise que comentei anteriormente. Num sábado à noite no início de julho do ano passado, meu telefone tocou. 

“Eu sei que é sábado, mas você pode ir comigo no treinamento de imprensa? Amanhã é a minha primeira entrevista”

“Posso sim.” – não hesitei. 

Nessa hora o convite não tinha nada a ver com trabalho. Tinha a ver com minha atuação no desenvolvimento de lideranças. Líderes são pessoas excepcionais mas que também são de carne e osso. Por vezes o trabalho é só sobre estar ao lado deles e dizer: eu sei que é desafiador, sei que você vai encarar de maneira brilhante, mas você não está só. Eu exerço esse papel de desenvolver pessoas e líderes desde que me entendo como profissional… ele acontece não só com liderados ou por meio das mentorias. A todo momento estamos influenciando as pessoas positiva ou negativamente, mesmo quando elas são nossas chefias imediatas. 

Durante o treinamento de imprensa ouço uma coisa muito poderosa. Um convite para mudar de trabalho que continha em si um chamado para uma missão, daqueles que não se recusa. Engraçado como as conversas poderosas acontecem no meio de outras atividades da rotina. 

“Carol, eu não aguento mais. Não aguento mais ouvir histórias de violência contra a mulher. Eu quero mudar isso, não só para a Caixa Econômica (nesse momento você descobriu onde foi a gestão de crise) mas para o Brasil.” 

É grandioso reconhecer quando estamos frente a frente com uma liderança que tem coragem e os meios de agir. Ante a um convite como esse, não havia como hesitar. Aceitei o desafio. 

O próximo mês foi um intensivo, sem finais de semana – afinal crises não esperam – e junto com tudo isso uma das minhas maiores conquistas de carreira: juntar o setor público e o privado em prol de uma causa, indo de um banco público aos times de futebol. 

Mas foi preciso assumir a dor. Sentir toda ela. Lembro de ter chorado por duas semanas a cada dado de violência que eu lia. Há que ter muito estofo emocional para trabalhar com temas como a violência. Mas não há mais como dissociar um líder que constrói futuros da coragem de enfrentar os pontos nevrálgicos e agir. 

Não há mais tempo nem recursos do planeta para outro tipo de liderança. 

 

Terceiro ponto: não adianta procurar uma receita de bolo

 

O grande desafio do ESG é que há espaço para tantas estratégias robustas de ESG quanto há empresas no mundo. O paralelo que eu faço é a estratégia de inovação. Ela é única para cada empresa. 

As métricas de mensuração de impacto e de resultado podem e devem evoluir para serem comparáveis – tema que avançou na agenda de meio ambiente mas ainda precisa evoluir na agenda social – mas a estratégia em si é o grande diferencial das empresas. É o que irá gerar valor no longo prazo. 

O fato de não ter uma receita única coloca as empresas num grande desconforto. Porque assim como a inovação, que tem um risco e não se quantifica no curtíssimo prazo, o mesmo ocorre com a estratégia de ESG. Não é tão tangível e quantificável o valor que ela gera no momento que algum executivo propõe. Mas aí, podemos aprender com as crises das outras empresas e esperar o pior ou… arregaçar as mangas e agir. 

Agir significa: treinamento, consultoria, benchmarks, conversa com especialistas, projetos, incluir no plano estratégico. Significa dedicar orçamento e executar orçamento sobre o tema. 

Os resultados positivos chegam. Interna e externamente. Para os colaboradores é uma questão de orgulho atuar em uma empresa responsável e isso se materializa em uma menor rotatividade dos funcionários. Externamente é sobre reputação e valor de marca, fluxo de caixa e tantos outros ganhos – alguns deles tangíveis e outros intangíveis, que é carregar o sorriso de saber que a coisa certa foi feita.

Com isso chego no quarto ponto e ponto bônus: a sociedade civil somos nós. ESG não se encerra no setor privado. Ou ainda, como falo nas palestras para executivos: ESG é da porta para dentro. Nova Economia é assumir participação e pertencimento sobre o futuro que queremos construir. Cabe a nós exercer nossa liderança cívica, se articular com as pautas que são importantes e abrir o diálogo com nossos governantes. Afinal Governança tem a ver com o combate à corrupção. Social com os desafios de combate à desigualdade e Meio Ambiente é a base disso tudo, afinal sem natureza viva e preservada não tem nem recursos para os negócios nem condições para seguirmos vivos. É um caminho sem volta, no qual chega melhor quem se prepara primeiro, quem assume a liderança. 

Que esse texto inspire a sua liderança para propor a mudança necessária e com isso construir futuros prósperos.

Um feliz 2023.